Falciformação atinge cerca de 2%da população angolana

Cerca de 2% dos angolanos sofrem de anemia falciforme (hemoglobina SS) e outros 20% são portadores (hemoglobina AS), segundo um estudo realizado por especialistas do Hospital Pediátrico David Bernardino, entre 2011 e -2020.

A pediatra Brígida dos Santos, que coordenava o site de Anemia Falciforme na época, disse que os números representavam uma grande ameaça ao país.

O alerta do médico decorre do facto de as pessoas poderem formar casais e, no futuro, ter filhos com doença falciforme, que já é considerada um grave problema de saúde pública em Angola.

Brígida dos Santos explicou que, na época, era mais fácil fazer-se o diagnóstico da patologia, uma vez que em quase todas as maternidades de Luanda e não só realizavam-se, logo à nascença, o Exame do Pezinho, nome popular do teste de Guthrie, que permite detectar nas primeiras 48 horas de vida a presença da doença.

"As maternidades colhiam o sangue e enviavam para o Hospital Pediátrico de Luanda, para que fizéssemos o diagnóstico e apresentá-las os resultados e permitir que essas instituições começassem já a fazer o seguimento da criança”, explicou.

Actualmente, salientou que há limites para a continuidade deste programa e é difícil saber quantas crianças com anemia falciforme nascem no país ou em Luanda, se não se limitarem ao Departamento da Criança de Luanda.

Brígida dos Santos, atual diretora de saúde do Instituto Hematológico Dr. Victória do Espírito Santo, salientou que, para além da investigação realizada, o Hospital Infantil de Luanda desenvolveu também um programa que visa formar mais especialistas de várias unidades de saúde, no diagnóstico e acompanhamento da doença.

O programa permitiu a hospitais como o Materno-Infantil do Kilamba Kiaxi, Cajueiros, Municipal de Cacuaco, Provincial do Huambo e Cabinda, entre outros, negociar a anemia falciforme, para assistir e acompanhar mais doentes.

O pediatra disse que estas unidades acompanham sempre os doentes e só devem encaminhar os casos graves da doença, em regra, para a Pediatria de Luanda e, agora, para o Instituto Hematológico, deliberadamente criado de forma diferente, para doentes com anemia falciforme. anemia e hemofilia.

Média de casos novos 

A especialista em Pediatria, que tem, igualmente, uma formação em Hematologia, disse que antes da pandemia da Covid-19, a média de casos era de cerca de mil novos casos de anemia de células falciforme por ano.

Mas, a partir de 2020, por causa das limitações impostas pela pandemia, a Pediatria registou 400 novos casos. Em 2021, os números aumentaram para 947 diagnosticados e, neste ano, já estão anotados 472 novos doentes.

Além desses dados, obtidos em consultas na Pediatria de Luanda, a médica fez referência às estatísticas do Instituto Hematológico Dra. Victória do Espírito Santo, onde já foram diagnosticados 858 novos casos, desde a sua inauguração em Março deste ano.

Questionada se o Hospital Infantil de Luanda vai continuar a receber crianças com anemia falciforme, tendo em conta o lançamento do Instituto Hematológico, Brígida dos Santos explicou que o primeiro centro trata da primeira consulta de crianças com menos problemas, e que os casos complexos vão acabar no segundo centro , pois tem mais valência.

Explicou que o centro tem um ambulatório, onde os doentes são contactados, recebem medicação e regressam a casa. Mas se a situação fosse grave, disse ele, eles seriam monitorados, tratados por várias horas e, se não melhorassem, seriam internados em um hospital infantil.

Mortes até 15%

Brígida dos Santos lamenta que dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) mostrem que a mortalidade infantil, até cinco anos de idade, por anemia falciforme, tenha um peso médio global de cerca de 15%.

Em Angola, principalmente no Hospital Infantil de Luanda, das 1.256 crianças internadas, pelo menos 38 morreram só no ano passado.

“E é justo dizer que o número de mortos pode ser alto, já que muitos morrem sem serem diagnosticados com a doença e ela aparece depois de fazer o histórico familiar, quando os pais aparecem em consulta com outra criança, às vezes”, disse. médico.

Pais doentes dão a crianças doentes

O diretor clínico do Instituto Hematológico disse que na anemia falciforme, além dos pacientes, existem os portadores.

"A diferença é que o paciente tem ambas as hemoglobinas SS, e seus sujeitos têm A e S, por isso são AS", explicou o médico.

Um especialista em hematologia explicou que um casal que está grávida (hemoglobina AS) pode ter filhos com a doença, pois, durante a fecundação, o bebê tem mais chances de receber hemoglobina S do pai e da mãe e, assim, nascer. os doentes (SS).

"Este mesmo casal também pode gerar filhos com traços da doença, tendo em conta que a criança vai herdar a hemoglobina S do pai e A da mãe, nascendo portadora (AS) e nunca manifestar nenhuma complicação durante a sua vida, podendo ser, inclusive, um atleta de alta competição, sem problemas”, minimizou.

Brígida dos Santos informou, ainda, que o referido casal pode gerar filho sem nenhum traço de anemia falciforme, pelo facto do bebé herdar a hemoglobina A, quer do pai quer da mãe e resultando em AA.

Quanto às pessoas já doentes (hemoglobinas SS), a médica disse que esses terão sempre filhos doentes. "Um homem que é SS, se fizer filho com uma mulher portadora, só terão ou filhos doentes ou portadores. Nunca vão gerar crianças livres dos traços de anemia falciforme”. 

Por isso, aconselhou que "não convém que se façam filhos com pessoas do mesmo grupo, para cortar esta cadeia de transmissão ou, melhor, os novos casais devem ganhar o hábito de fazer exames pré-nupciais e evitar sofrimento e separações futuras, por terem gerado filhos doentes”.

Medicação é diária

Todos os dias, os doentes de anemia falciforme devem tomar o ácido fólico e hidroxiuréia, assim como antibióticos específicos sempre que necessário, para prevenir as formas graves da doença.

Além disso, os pacientes devem seguir uma alimentação variada, equilibrada e sem restrições, sem esquecer que devem ser higiênicos e vestir-se adequadamente de acordo com a estação do ano, o que minimiza as complicações.

O médico destacou que os medicamentos nem sempre estão disponíveis em todas as áreas onde os pacientes estão doentes. "Por isso, é difícil para muitas famílias com recursos limitados conseguir medicamentos nas farmácias, dificultando ainda mais a condição dos pacientes", lamentou.

Sobre o acompanhamento dos doentes, Brigida dos Santos realçou que este deve ser multidisciplinar, envolvendo vários especialistas, porque a doença atinge vários órgãos. E, no caso específico dos homens, normalmente, quando atingem os 10 ou 12 anos desenvolvem o priapismo, que é a erecção prolongada e dolorosa do pénis, devido à falta de oxigénio no sangue.

Neste caso, prosseguiu a especialista, estes pacientes também devem ser seguidos por um urologista, para com uma medicação adequada, sintam a redução desses sintomas. "Se não forem controlados, os doentes podem cair, na vida adulta, na lista dos inférteis”, rematou.

Uma doença hereditária

Anemia das células falciforme ou anemia drepanocítica, como também é conhecida, é uma doença hereditária que causa alteração no formato dos glóbulos vermelhos, que, em vez de terem a forma de um disco, ficam semelhantes a uma foice ou meia-lua.

Brígida dos Santos explicou que, devido a essa alteração, os glóbulos vermelhos tornam-se  menos capazes de transportar oxigénio pelo corpo, o que causa sintomas típicos e iniciais como cansaço excessivo, palidez, crises de dor, muito choro (se for bebé), assim como esses doentes podem ter um quadro súbito de anemia grave com necessidade de transfusão urgente.

"Esses doentes, também, podem ter infecções bacterianas e, nos casos mais dramáticos, chegam aos acidentes vasculares cerebrais (AVC). E, como a doença está ligada à hemoglobina, que tem a função de transportar o oxigénio para toda as partes do corpo, com essa deficiência, os órgãos sofrem uma lesão progressiva e crónica”, realçou a médica.

Portanto, de acordo com um especialista em hematologia, baço e fígado aumentam de tamanho e há alterações nos ossos e articulações, muitos desses sintomas começam a aparecer entre os cinco e seis meses de idade e em cerca de dois meses.

Quanto a quem é a célula falciforme, disse, em regra, algumas doenças são mais prevalentes, devido à debilidade do próprio organismo, razão pela qual o Calendário Nacional de Imunizações inclui metas importantes para este grupo de doentes, que carecem, ainda, de , pneumo. 23.

Brigida dos Santos explicou que a anemia falciforme nem sempre indica deficiência de ferro, como muitos afirmam, embora às vezes possa ser associada, porque a anemia falciforme destrói as células rapidamente.

"Em média, uma célula tem uma vida útil de 120 dias, mas na anemia falciforme, as células vivem apenas 30 dias. Além disso, para produzir novas células, são necessários nutrientes semelhantes ao ferro", explica o hematologista.

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